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ENTREVISTAS

11/2022

Stefany Louize Muniz Gouveia
Stefany Louize Muniz Gouveia

Leia a entrevista deste mês: Stefany, 26 anos, paulistana
e hoje moradora de Osasco.
Ela relata como lidou com a surdez, a retinose pigmentar e
consequentemente
a síndrome de Usher.
Confira! 

1) Stefany, conta para nós como descobriram sua surdez.

Eu tinha uns 5 anos de idade e ficava muito grudada na televisão. Embora falasse normalmente, minha mãe começou a suspeitar. Também se me chamavam baixinho, eu não escutava, então meus pais me levaram no médico e descobriram perda auditiva leve/moderada.

 

2) Aí no seu caso o médico indicou aparelhos auditivos? Se sim, como foi a sua adaptação?

Sim... depois deste diagnóstico eu usei o modelo retroauricular por uns anos até quando comecei a frequentar escola, mas odiava e me sentia mal.

 

3) Mas você conseguia acompanhar as aulas? Não tinha dificuldades?

Eu estudei em escola em que tinham alunos surdos e eles apontavam, me cercavam querendo dizer que eu era um deles, porém pra mim era como se eles tivessem rindo, não entendia e foi aí que decidi, por conta própria, parar de usar os aparelhos. Em relação aos estudos, algumas vezes perdia alguns detalhes caso sentasse mais longe ou não estivesse olhando para o professor, porém sempre procurei sentar mais a frente e sempre fui dedicada, nunca precisei de reforço ou aulas especiais, fiz o ensino médio e a faculdade e muitas pessoas (alunos e professores nem ficavam sabendo da minha perda auditiva.

 

4) Stefany, você sofria bullyng por ser surda?

Não, isso não aconteceu comigo. Porém, sempre tive muita resistência ao uso do aparelho, principalmente por ele ser visível atrás da orelha.

 

5) E hoje? Como está a sua audição?

Atualmente, convivo bem e a leitura labial me ajuda muito. Trabalho no Bradesco, na Secretaria Geral. O lugar é acessível, meus colegas me ajudam, as pessoas falam mais alto comigo se necessário. Acho que o aparelho melhoraria minha qualidade de vida e portanto, estou pensando muito sobre usar novamente.

 

6) Stefany, conta para nós como você percebeu que estava com dificuldades para enxergar.

Eu comecei a ter dificuldade para achar as coisas no chão como por exemplo, sabonete que caia no banho, subir e descer degraus à noite e comecei a sentir muitas dores de cabeça. Fui ao médico e ele pediu para fazer exames de labirintite, embora não tivesse crises de tontura, achamos que era isso.

Eu também procurei oftalmologista que passou uma série de exames, mas quando fiz o campo visual é que fui orientada por ele a procurar um retinólogo que pudesse me diagnosticar melhor. Fui em um que falou para mim: “Você tem uma doença que afeta a visão gradativamente”... Só falou isso e nada mais. Sai chorando do consultório.

Como temos convênio, meu pai conseguiu indicação de um médico que conhecia a doença, o querido Doutor Jorge Mitri, que infelizmente faleceu em junho. Com ele tivemos o diagnóstico de retinose pigmentar e um melhor entendimento da doença, fui acompanhada por ele durante quatro anos.

 

7) Ai esse retinólogo te explicou melhor sobre a retinose pigmentar?

Sim! Ele mostrou aquele exame da retina, mostrou a área afetada, explicou sobre o campo visual, a cegueira noturna e a perda gradativa da visão. Explicou também o que era a Síndrome de Usher.

 

8) Como você reagiu ao saber do diagnóstico da síndrome de Usher?

Sinceramente? A síndrome não fez tanta diferença, porque a perda auditiva eu já sabia e lidava bem. A questão foi a retinose pigmentar que me abalou demais, era extremamente difícil fazer os exames, ir na consulta. Eu começava a chorar semanas antes, ficava extremamente tensa e abalada.

 

9) Você já tinha ouvido falar da síndrome de Usher antes? Depois que você soube do diagnóstico, procurou saber mais sobre a síndrome ou não?

Nunca tinha ouvido falar. Minha família e meu noivo desde o começo acompanhou muito de perto, sempre muito presentes e participativos, então eles pesquisaram muito, já eu não... Pois não queria saber sobre isto, não estava preparada. Saber sobre a síndrome me deixava muito mal. E quando tive um pouco de coragem, achei o instagram @sindromedeusherbrasil e conheci você, Ana, que me deu esperança. Conversei com uma de suas entrevistadas a Laise Estrich e ela me deu uma luz. Ela falou coisas boas, e a história dela é muito parecida com a minha, estava noiva e hoje é casada. E eu naquela época pensei: “Em vez de ter raiva de tudo mais, devo olhar as coisas boas”. Tenho pais extremamente cuidadosos e amigos, meu noivo me fez lutar, seguir em frente, ele acredita em tudo que eu faço e me dá muito incentivo. Minha irmã que me ouve e me dá forças. A família do Celso, meu noivo, que me acolheu. Deus colocou pessoas abençoadas na minha vida. Foi muito bom conhecer você, o insta, a Laise!

 

10) Você fez o teste genético? Se sim, qual é o seu tipo?

Fiz sim. Sou Usher 2A.

 

11) Você tem irmãos Stefany? Na sua família tem mais casos de pessoas com síndrome de Usher?

Tenho uma irmã e graças a Deus ela não tem Usher e pelo que nós sabemos, não temos mais casos na família.

 

12) Stefany e como está a sua visão hoje? Você procura ir no retinólogo regularmente? Faz uso de vitaminas ou segue um tipo de alimentação, faz exercícios físicos?

Por enquanto minha visão está da mesma forma, graças a Deus! Porém eu estou com um edema macular e estou tratando com colírios. Faço exames e consultas regularmente. Exercícios tenho mais dificuldades, mas procuro sim me alimentar bem e tomo vitaminas.

 

13) Na sua opinião, você passou a ser uma pessoa melhor depois que soube que tem a Síndrome de Usher?

Não... sinceramente ao meu ver não! Sempre fui uma pessoa dependente até antes da descoberta da síndrome de Usher porque eu prefiro fazer as coisas acompanhada e com a descoberta da doença tove mais insegurança  e eu vejo que me tornei muito mais dependente e isso me incomoda, apesar de eu ter terminado a faculdade, feito inglês e trabalhar no banco... Eu me preocupo com a minha dependência das pessoas para realizar algumas coisas.  

 

14) Stefany, conte mais para nós o que seria essa dependência.

Então, para ir trabalhar antes da pandemia eu ia e voltava de ônibus porque é perto de casa e atualmente meu pai acaba me levando, ele acha mais seguro. Quando fiz faculdade estava no processo de adaptação da doença e então meus pais e meu noivo revezavam para me buscar.

Eu gosto muito de sair, mas sempre acompanhada de meu noivo ou da minha família. Eu sei que sou medrosa principalmente depois que soube do diagnóstico da Usher. Quando tem muita gente no local, eu fico com muito medo em esbarrar ou derrubar aquelas placas de piso molhado. Fico extremamente chateada, às vezes de quando eu vou para o médico e tenho medo de não escutar me chamarem, um lugar novo que eu não conheça, mas eu me viro se for necessário. Uma vez uma amiga minha me chamou para ir no aniversário dela em um lugar que eu sabia que era escuro e aí eu chamei minha irmã. Então assim, eu me vejo muito dependente. Ainda bem que existe o Uber!

Sou grata porque ninguém nunca me fez eu me sentir assim, eu sei que é mais coisa minha mesmo. Gostaria de ser menos dependente e realizar algumas coisas sozinha... bom, pelo menos estou sempre bem acompanhada!

 

15) Para finalizar, qual conselho que você dá para uma pessoa que acabou de saber que tem a síndrome de Usher?

Eu acho que quando a gente descobre uma doença que trazem limitações para a gente, ficamos com raiva e com medo. Então a gente fica perguntando: “Por que isso está acontecendo comigo e não com uma pessoa ruim?” Não que eu seja melhor ou pior que alguém, mas a gente pensa desta forma porque somos humanos, né?

Então independente da religião, da crença temos que ter fé.  Eu acredito em Deus. Eu aprendi, passei por uma fase ruim, mas graças a Deus eu tive pessoas que me ajudaram a lutar. Deus coloca pessoas muito boas do nosso lado para ajudar a gente. Assim como minha irmã que me acompanha em lugares que não gosta de ir, mas para eu não ir sozinha vai junto comigo. O meu noivo nunca me abandonou, nunca desistiu, nunca deixa eu desistir, tenho amigos que cuidam, se dispõem a me acompanhar, são sensíveis, me mandam chocolate quando vou nas consultas.

Então o conselho que dou é: não desista! Converse com as pessoas, não passe por isso sozinho. Às vezes as pessoas não sabem te dizer quando você descobre uma coisa dessa mas permita que as pessoas te ajudem. Quando você permite ajuda, você tem em quem apoiar. Hoje eu sou uma pessoa mais aberta, porque eu fui atrás de pessoas para conversar como a Ana, que procurei saber mais de informações sobre a Usher. Ela é uma grande conscientizadora, meus pais são muito gratos a ela e dizem que ela trouxe uma esperança. Sempre existem pessoas passando pelo mesmo que você e além de ser ajudado, você pode ajudar.

Eu estou à disposição também se alguém quiserem conversar, pode me chamar no whatsapp, instagram, eu sou super aberta para conversar, para contar minha história. Hoje eu sou uma pessoa muito alegre, eu vejo a minha doença de uma forma muito divertida, eu comento brincando e procuro não deixar a doença ditar a minha vida. Em breve eu me caso com o homem da minha vida, com um vestido lindo e verei todos os que sempre me apoiaram lá. O sol aparece para todos, só não vê quem não quer.

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