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ENTREVISTAS

07/2022

Fabiane Alves
Fabiane Alves

A entrevista deste mês
é da Fabiane, 35 anos
que nasceu em Brasília
e hoje mora na cidade
Alvorada do Oeste em Rondônia. Aqui ela relata como aprendeu Libras e como lidou

com as dificuldades
da síndrome de Usher.
Leia mais!

1) Fabiane conte para nós como descobriram sua surdez.

Eu tinha 6 meses de idade quando minha mãe me levou para consultar com nerouropediatra e ele falou que eu não tinha problema neurológico e então fiquei em observação. Quando eu tinha mais ou menos 8 meses, minha mãe percebeu que eu não reagia ao chamar meu nome e também aos barulhos. Então passamos com o mesmo neuropediatra e ele pediu a audiometria. O resultado foi que eu tenho perda auditiva profunda.

 

2) Mesmo com a perda profunda da audição, o médico te indicou aparelhos auditivos?

Sim, passou. E também indicou uma escola onde tinha o método de oralização.

 

3) E como foi a sua adaptação com aparelhos auditivos?

Quando criança, usei por bastante tempo. No começo usei aquele aparelho auditivo antigo, tipo “radinho com cordinha”. Depois usei de outro modelo. Mas infelizmente, não fazia diferença.

 

4) Foi neste período que você aprendeu Libras?

Então, esta escola que falei, minha mãe me matriculou com idade de 1 ano e pouco. Mas como não desenvolvia a fala, eles avisaram que eu precisava ir para outra escola. Na época criou o primeiro grupo de crianças surdas com Libras no DF (Brasília), na rede pública. No começo o atendimento era 2 vezes por semana. No treino de Libras, eu era bem pequena ainda e minha mãe também treinava e aprendia junto. Depois de algum tempo, montaram um grupo que seria o pré-1, acrescentaram fono, natação e outros atendimentos.

 

5) Como você foi na escola? Você teve dificuldades para acompanhar as aulas?

Quando tinha 4 anos, comecei a estudar no pré, em escola pública, mas a sala era sempre só de alunos surdos e professores bilíngues. Depois disto, mudei várias vezes de escolas públicas, por causa da falta do profissional da Libras ou porque faltavam salas. Cresci, estudei no matutino e vespertino em 2 escolas, uma normal e outras atividades diferenciadas e de reforço. Na época, os professores eram maravilhosos e também organizavam os teatros e outras tarefas para apresentar. Lembro quando tinha 14 anos, eu estava na sétima e oitava série, estudava com os surdos mais velhos que eu, eles tinham uns 20 até 30 anos de idade e foi muito bacana, aprendi muito com eles!

 

6) Fabiane conte para nós quando você começou a ter problemas visuais.

Eu comecei a ter problemas visuais aos 4 anos. Na época, minha mãe percebeu que eu ficava muito perto da televisão porque era muito pequena. Então, comecei usar óculos para miopia e astigmatismo na pré-escola. Depois de alguns anos passei a não usar mais os óculos... Mudei de Brasília para Rondônia em 2003 e eu tinha mais ou menos 16 anos. Comecei a perceber algo diferente na minha visão, principalmente à noite. Quando ia para a faculdade eu caminhava com dificuldades para enxergar, meus movimentos ficaram meio cambaleantes. E então fui no oftalmo, mas ele não conseguiu diagnosticar e me orientou a usar os óculos. Porém, mesmo assim, senti piora para enxergar à noite, procurei um especialista da retina e ele me deu o diagnóstico de síndrome de Usher.

 

7) Você já tinha ouvido falar dessa síndrome antes?

Não, nunca ouvi falar...

 

8) Qual foi a sua reação ao saber disto?

Então, na consulta que fiquei sabendo sobre a síndrome de Usher, o médico não queria falar diretamente comigo e então conversou mais com a minha mãe: "Vai ficar cega aos 40 anos, depende do caso... Ela vai precisar se aposentar". Isso me deixou muito abalada. Eu chorei muito, foi uma fase difícil. Minha família ficou desesperada, a surdez parecia muito fácil perto da cegueira, então foi um longo processo para me aceitar como surdocega. Na época, eu pensei: "Como vou ensinar as crianças surdas? Como vou ministrar curso básico e avançado de Libras para professores no período noturno?". Portanto, eu pensava em mudar de trabalho para tarde, mas não deu certo. Continuava dar aula no curso noturno uma vez na semana e outro no matutino. Neste período, tive que mudar muitas coisas. No meu caso, estava começando a ter problemas com Libras, pois não enxergava as pessoas sinalizando para mim e não queria aprender Libras tátil. Na época, eu também terminei o namoro, passei a não sair, deixei de usar saltos, me isolei mesmo, ficava mais no meu quarto. Um ano depois, conheci mais a Deus, me converti, batizei e conheci muitos amigos novos na qual evangelizamos os surdos, organizamos vários eventos e também viajamos muito... Antes sentia vergonha de usar bengala, mas depois que caí na rua várias vezes, decidi usar, era mais seguro. Foi um processo longo, mas me adaptei.

 

9) Na sua família tem mais casos de pessoas com Usher?

Na família não... mas meu irmão também é surdo e enxerga mal, mas segundo os médicos ele tem Stargardt.

 

10) Vocês fizeram teste genético?

Por enquanto só eu fiz o teste genético. Estou aguardando o resultado.

 

11) E como está sua visão hoje?

Hoje a retinose por enquanto está estacionada, não tenho catarata graças a Deus. Sinto, de vez em quando, os olhos coçarem.

 

12) Fabiane, depois que você soube da síndrome de Usher você passou a ter mais cuidados? Você teve que adaptar no seu dia a dia?

Quando eu estudava, procurava sentar na frente. Já no trabalho, mudei a mesa de lugar para perto da janela. Passei a ter mais cuidado na hora de andar, subir e descer escadas, mas sempre prefiro andar na rampa. Em casa fui adaptando tudo que fosse possível: lâmpadas mais fortes, mais espaços vazios, enfim muitas coisas...

 

13) Mesmo com o diagnóstico da Usher, você continuou com seus estudos? Em que você se formou?

Formei em pedagogia, fiz pós-graduação em Libras. Atualmente, faço cursos online de Libras tátil com professores Carlos Junior e Janaína.

 

14) Como é a acessibilidade aí em Rondônia? Existe um trabalho com pessoas surdocegas?

Então, aqui onde moro, a cidade é pequena, mas é tranquila. Por aqui em alguns aspectos da acessibilidade como piso tátil e rampas são obrigatórios. A iluminação no centro da cidade são ótimas e são de cores amarelas. O que precisava melhorar mesmo são as ruas que são desniveladas. Quanto ao trabalho com surdocegos, no meu caso por exemplo, na época, tive que lutar muito, apesar de que consegui terminar meu segundo curso de faculdade, que foi  pedagogia no noturno. Na primeira faculdade, tive que largar por falta de intérpretes. Hoje, onde eu moro, as pessoas tem uma certa noção de que é a surdocegueira, mas ainda temos dificuldades em relação à acessibilidade. Conheci pessoalmente, uma aluna surdocega, de 16 anos. Ela não sabe muito Libras e estuda no ensino médio e tem intérprete., mas ambas moram em cidades diferentes, o que dificulta na maioria das vezes. Soube de um menino de 5 ou 6 anos, ele tem intérprete, mas não frequenta a escola, então o atendimento é bem precário. Há um tempo atrás tinha 2 surdoscegos jovens que trabalhavam em um supermercado, eram ótimos empregos para eles, mas tiveram que mudar para outro Estado.  Aqui na cidade, muitos conhecem o termo surdocegueira por causa da minha história... rs

 

15) Fabiane, você acha que se tornou uma pessoa melhor depois que descobriu a síndrome de Usher?

Após descobrir a minha Usher, pesquisei bastante no Google, assisti vários vídeos no YouTube e achei um da Rosani Suzin, aí me interessei muito nas falas dela. Aprendi muita coisa e depois ela me adicionou no grupo dos surdocegos adquiridos. Fiz também curso presencial, em 2017, com Hélio Fonseca e Carlos Junior aqui mesmo em Rondônia. Quando eu estudava na pós-graduação em Libras, o Hélio percebeu algo em mim e perguntou: "Você tem síndrome de usher?". Fiquei surpresa com isto, pois na época eu não contava para ninguém sobre a minha síndrome, porque tinha vergonha e também não me identificava como surdocega. Ele também me ensinou os sinais hápticos e o braile básico. Foi muito bom! Fiz também curso online com Lara Gontijo que é maravilhosa. Graças a estes cursos, consegui dar duas palestras sobre surdocegueira. Fiquei muito feliz pois consegui superar, consegui me aceitar como surdocega e ao mesmo tempo, ajudo aqueles que estão passando pelo mesmo problema de negação que eu tive.

 

16) E para finalizar, que conselho que você dá para a pessoa que acabou de saber que tem a sindrome de Usher?

Tenha muita calma, tudo se adapta! Quando puder, procure apoio da família, é muito importante! Foca em novos estudos e aceite novas profissões. Pense com energias positivas e seja feliz!

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