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ENTREVISTAS

08/2022

Anne Caroline Gularte Moraes
Anne Caroline Gularte Moraes

A gaúcha de Porto Alegre
e atualmente moradora
de Gravataí (RS),
Anne de 37 anos,
nos conta nessa entrevista,
a sua trajetória como uma pessoa com síndrome de Usher.
Leia mais no relato abaixo!

1) Anne conte para nós sobre a sua surdez, como descobriram que você não estava escutando direito...

Aos 7 anos de idade, eu não reagia com som da TV ao assistir desenhos, então comecei aumentar o volume e também tinha dificuldades de compreensão da fala. E assim, minha mãe me levou ao otorrino, foi feito a audiometria, onde foi descoberto a perda auditiva moderada para severa. O médico indicou aparelhos auditivos e assim que possível adquiri o modelo AASi antigo. Ao longo da minha vida tive 3 aparelhos.

 

2) E como está a sua audição hoje?

No momento meu aparelho está estragado, minha otorrinolaringologista fez solicitação de novos exames para descobrir a causa da surdez e fez a indicação da prótese pelo SUS. Mas geralmente não uso aparelhos auditivos, porque não me adaptei, eles sempre me incomodaram. Tenho forte dores de cabeça, enxaqueca devido ao barulho. Sons muito altos, agudos e graves me incomodam mesmo e barulho repetitivos me irritam.

 

3) Você disse que não se adaptou com aparelhos quando criança, então como você foi na escola? Teve muitas dificuldades em acompanhar as aulas?

Aprendi a fazer leitura labial e eu sempre sentava na frente. Nunca consegui me adaptar com os aparelhos auditivos porque o barulho me incomodava e ainda hoje incomoda.

 

4) Anne quando e como você começou a ter problemas visuais? Conte para nós.

Então, eu comecei a usar os óculos, quando estava no segundo grau. Tenho miopia e astigmatismo. Mas quando eu era adolescente é que comecei a perceber que enxergava mal. Sempre tive problemas visuais, mas nunca dei importância, porque achava natural da forma como eu enxergava. No meu ponto de vista, todos enxergavam assim... Eu só fui diagnosticada mesmo, após os 20 anos pois eu comecei a sair mais à noite. Então eu tinha muita dificuldade de locomoção, de enxergar as pessoas, de enxergar objetos, placas, escadas degraus e afins. À noite as pessoas me cumprimentavam e eu não enxergava e também não ouvia... No dia seguinte eles comentavam que me viram e eu não tinha cumprimentado, na verdade eu não tinha nem enxergado as pessoas. E eu também caía muito, batia, esbarrava no orelhão, derrubava as coisas, as pessoas, levava o poste, as placas... rs.  Só foi descoberto o problema visual após comentar com o meu oftalmologista, que me passou novos exames, pois ele estava com suspeita da síndrome.

 

5) Você passou em um especialista em retina (retinólogo) para chegar a esse diagnóstico de retinose pigmentar?

Eu fiz exames solicitados pelo meu oftalmologista, fiz no Hospital Santa Casa em Porto Alegre, aonde foi constatado a retinose pigmentar. Ele já sabia da minha perda auditiva, do meu histórico, quando eu comentei com ele sobre a dificuldade de locomoção à noite.  

 

6) Foi ele que te diagnosticou com síndrome de Usher?

Não, ele não me diagnósticou. Ele apenas fez a solicitação de exames da retina, para confirmar a suspeita. Na verdade, eu tive conhecimento da síndrome de Usher através dele que sabia do meu histórico de problema auditivo e com o meu relatório da dificuldade de locomoção noturna. Ele comentou que poderia ser a síndrome por causa dessas características. Desde que ele comentou comigo, eu comecei a ler e estudar mais sobre o assunto. E foi somente após eu fazer o teste genético e passar na consulta com a dra Juliana Sallum é que foi confirmado a síndrome de Usher e no meu caso é Usher2A.

 

7) Anne, depois que você passou com esse oftalmologista que suspeitava que era síndrome de Usher, qual foi a sua reação?

Desde o início quando ele comentou comigo a possibilidade de ser a síndrome, eu comecei a ler sobre o assunto e entender algumas dificuldades no qual eu tinha e ainda tenho. Logo aceitei a doença e comecei a mudar alguns hábitos.

 

8) E qual foi a sua reação ao consultar com Dra. Juliana Sallum e saber do diagnóstico confirmado?

É engraçado falar sobre isso porque eu sempre aceitei a doença desde a sua suspeita até falar com a doutora Sallum. Após a confirmação da síndrome, ao término da consulta online, fiquei aliviada... As lágrimas vieram... Porque a suspeita foi confirmada, então eu não sei te dizer o tipo de sentimento que eu tive... Só escorreu as lágrimas...

 

9) Na sua família, tem mais casos de pessoas com síndrome de Usher?

A doutora Sallum falou para mim que a síndrome è relacionada à genética e me perguntou se meus pais são primos. Eu disse que não. Eles não são e até então não temos conhecimento de algum familiar que possua. A suspeita é que parentes anteriores já falecidos deviam ter, mas nunca saberemos. Na minha família são três irmãos contando comigo e eu fui a única sorteada.

 

10) Anne, você falou das mudanças que você teve fazer. Quais foram essas mudanças, essas adaptações no seu dia a dia até hoje?

Bom, na verdade tive que adaptar em muitas coisas, uma delas foram contar degraus das escadas, decorar ambientes, objetos, empecilhos no caminho... Local desconhecido ou eu vou acompanhada ou eu vou durante o dia, nunca à noite. Embora tenha dificuldade de locomoção durante à luz do dia desde que começou a pandemia devido ao isolamento social, senti dificuldade na luz do dia também. Utilizo chapéu, boné, óculos escuros para sair durante o dia, pois muita claridade dói as vistas, dificultando a locomoção.

 

11) E em relação ao trabalho? Você teve muitas dificuldades?

Nos empregos anteriores eu tive bastante dificuldade para enxergar porque era um local muito iluminado e também para trabalhar como computador porque, por exemplo, eu não via a seta do mouse, que precisava ser adaptada para que eu pudesse localizar.

Quando eu era operadora de caixa numa loja no shopping, eu não enxergava o cliente na fila de espera para ser atendido. Na época, apesar de não me adaptar com aparelhos auditivos, eu usava para ver se ajudava, mas tinha muito barulhos internos e externos na loja e não conseguia ouvir o cliente me chamando para ser atendido e também não enxergava, pois simplesmente sumia das minhas vistas... Inclusive tive um grande problema com o meu gerente de loja que me humilhou na frente de uma cliente devido ao não atendimento, alegando que eu a estava ignorando. Ele sabia das minhas dificuldades, mas mesmo assim passou o meu caso para a chefia. Eu tentei conversar com eles para uma melhor adaptação do local de trabalho, mas não tive sucesso e devido às essas dificuldades, fui demitida sem motivo.

Hoje eu trabalho como operadora de telemarketing e estou me adaptando.

 

12) Anne e como é a acessibilidade aí na sua cidade? Tem trabalho dirigido para as pessoas surdocegas, pessoas com Usher?

Na cidade onde moro, a acessibilidade está em falta... Em muitos locais até evito de sair à noite. Não tem nada dirigido à pessoa surdocega, somente na capital Porto Alegre é que tem um pouco mais de estrutura.

 

13) O que você acha que precisa melhorar em termos de acessibilidade em geral aqui no Brasil?

Se tratando do nosso caso poderia ter mais indicação como pisos táteis, escadas com tarjas amarelas, placas. Locais muito escuros ou muito iluminado deveriam conter indicativos para pessoas com baixa visão ou cegas como por exemplo, braile. As portas de vidro de lojas, por exemplo, deveria conter um adesivo, alguma coisa para que a pessoa pudesse enxergar o vidro, porque os vidros e as placas amarelas de chão nas lojas e  shoppings por exemplo, são os nossos inimigos e a latas de lixo também... Nossas canelas são as que mais sofrem! Em alguns locais no qual eu saio, eu fico parada e conto quantos degraus tem para não cair no chão. Também decoro o ambiente para saber se tem vidro no local ou não.

 

14) Anne, você acha que se tornou uma pessoa melhor depois que soube que tem a síndrome de Usher?

Hoje em dia eu vejo que sim, eu amadureci, mudei bastante. Não utilizo das minhas deficiências como uma justificativa de erros e acertos nem mesmo para me beneficiar em algo, pelo contrário, eu ergo a cabeça e sigo em frente. Digo isso porque tem muitas pessoas que às vezes nem tem uma deficiência mas utiliza de um fato para justificar seus erros ou até mesmo para se “vitimizar” falando em português claro.

 

15) E para finalizar, qual conselho que você dá para uma pessoa que acabou de saber que tem a síndrome de Usher?

Sinceramente falando: a aceitação vem ao longo do tempo e com o tempo a gente aprende a se adaptar. Então, nunca podemos deixar a peteca cair. Costumo dizer que o meu foco sempre é pensamento positivo, então, seja positivo. E outra: a fé move montanhas e indiferente da religião, o nosso Deus é um só.

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